Com apenas uma católica, as evangélicas
predominam na Raposo Tavares. Programação diária de cultos tem diversos
horários para públicos distintos.
Quem passa pela Avenida Raposo
Tavares, na periferia de Piracicaba (SP), encontra em praticamente
qualquer hora do dia um culto religioso acontecendo. A via tem 20
igrejas, sendo apenas uma católica, ao longo dos seus 2,5 quilômetros de
extensão.
As evangélicas se revezam em programações diárias em
todas as horas e para todos os públicos na "avenida da fé". Se um pastor
ou pregador não agrada, é possível, literalmente, atravessar a rua e
acompanhar outro culto.
Lideranças
religiosas, frequentadores e um especialista procurado pelo G1
relataram uma série de explicações possíveis para a aglomeração atípica
de templos, sobretudo os evangélicos. A grande movimentação da avenida, a
fragmentação de comunidades religiosas que criam ramificações,
oportunismo comercial e religiosidade em excesso foram algumas das
características elencadas pelos entrevistados.
A Raposo Tavares
não é conhecida apenas pelas igrejas. A avenida é um dos corredores
comerciais mais movimentados na periferia da cidade e reúne lojas de
roupas, borracharias, bares, padarias e todo o tipo de comércio, além de
ser passagem para linhas do transporte urbano, pois está entre dois
terminais de ônibus. A grande circulação de veículos e pessoas pela
região foi apontada por todos os entrevistados como fator de peso para a
concentração de igrejas.
O pastor Rubens José de Melo Almeida,
de 46 anos, preside a Igreja Agnus há quatro anos, mas veio da Igreja do
Evangelho Quadrangular, que fica somente a algumas quadras de
distância. Ele conta que a identificação do fiel é o principal fator
para a diversidade de templos. "Claro que há casos de oportunismo, mas
na maioria das vezes o crente vai escolher o local onde entenda melhor a
mensagem do pastor ou se sinta mais à vontade. Considero essa
diversidade positiva, pois temos a palavra de Deus sendo dita por muita
gente", disse.
O jogador de futebol Isaac do Prado Donato, de 19
anos, chegou a frequentar uma Assembleia de Deus, mas preferiu o grupo
de jovens formado na Igreja Neo-Pentecostal. "Às vezes escolhemos pela
comunidade, mas no meu caso uns amigos convidaram e acabei gostando.
Acho bom esse grande número de igrejas, pois tira muitos jovens da
criminalidade e das drogas", contou o atleta.
Mesmo à tarde, há
um público fiel. "O local é ideal por ser movimentado e ter vários
bairros no entorno. Mesmo nesses horários que ninguém imagina há fiéis",
disse o diácono da igreja Internacional Promessa de Deus, Danilo
Augusto, de 25 anos. "O público das tardes é formado por mulheres,
jovens e aqueles que não trabalham", completou o presbítero da
Restaurando Vidas, Matheus Mandro, de 18 anos.
DiversidadeO
"leque" religioso vai das entidades mais tradicionais, como Assembleia
de Deus, Batista, Evangelho Quadrangular e as Pentecostais, até as
linhas mais modernas do protestantismo, como Universal do Reino de Deus,
Deus é Amor e as neo-pentecostais, passando ainda por ministérios
solitários, desenvolvidos pelos seus próprios pastores.
Assim como as igrejas, há muita diferença entre o trabalho dos pastores. Enquanto parte dos cultos aborda trechos da bíblia e
ensinamentos
referentes aos valores do protestantismo, também há locais em que as
palavras "dinheiro", "riqueza" e "oferta" são as mais ditas durante a
pregação. "A bíblia fala que quem não é dizimista está roubando a Deus.
Então, se o irmão quer ser abençoado, venha fazer sua oferta, mas se
quiser queimar no inferno, pode ficar aí sentado", disse o líder da
Igreja do Reino de Deus na Terra, criada há oito meses na cidade.
O
autor da frase ainda não obteve alvará de funcionamento e por isso não
quis se identificar para não chamar a atenção dos fiscais. Depois de
ministrar culto para apenas uma pessoa, sua esposa, o pastor considerou
muitos colegas oportunistas. "Muita gente escolheu a Raposo Tavares
depois de fazer pesquisa de público e para atrair mais fiéis. Eu só vim
para cá por falta de outro local, não me importo em atrair as pessoas,
mas em pregar o evangelho."
A abordagem sobre o dízimo acontece
em todas as igrejas, mas nem sempre associam a questão ao "pagamento por
dádivas". Por ser uma ação referendada por uma passagem citada na
bíblia e pela necessidade da manutenção e melhoria dos locais, a oferta
de dinheiro é também a forma para que os ministérios continuem os
cultos.
Ramificação ou fragmentação?O
mestre em ciência da religião Ismael Forte Valentim analisa que a
existência de várias igrejas em uma mesma avenida não representa apenas a
diversidade. "Em muitos casos, membros de uma igreja têm brigas
internas e resolvem se separar e abrir um templo ao lado da antiga, para
atrair os fiéis", disse.
Valentim ressaltou que os bairros do
entorno da Raposo Tavares são violentos na mesma medida que em outras
regiões da cidade e que não têm tantas igrejas. "Como há muitas
ramificações, creio que isso acaba dividindo as forças locais para ações
e reivindicações de peso. Não há unidade e articulação que permita
avanços sociais."
Fonte: G1
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